Coloque a sessão de RPG em primeiro lugar! [Nitro Dungeon – Dicas de Mestre]

Para muitos mestres, parte da diversão do RPG está na preparação da aventura. Criar tramas, armadilhas, PdMs para surpreender e divertir seus jogadores é parte do prazer que tenho em ser mestre de RPG. Porém, muitas vezes, ser mestre é padecer no Inferno; toda aquela preparação sensacional que você fez, todo aquele esforço de ler dez toneladas de material do cenário de sua campanha, são desperdiçados nas míseras horas que se tem para a sessão de jogo. Outras vezes, toda aquela história que era doida demais na sua cabeça, quando chega na hora do jogo, fica chata de contar para os jogadores, que fatalmente não se lembrarão nem de 10 por cento do que você falou.

O problema aqui está nas prioridades. A sessão de jogo é o ponto mais importante do RPG, é onde as coisas acontecem, onde a mágica da imaginação toma conta na criação coletiva de histórias (em um jeito Bob Esponja de descrever). Ultimamente tenho me esforçado em otimizar minha preparação para as sessões de jogo pois cheguei à conclusão que quero mestrar coisas variadas e diferentes mas não tenho tanto tempo para preparar as aventuras, naquele estilo burocrático e detalhista que costumava fazer.

Assim, mestrando Mutantes e Malfeitores, dentro dos esquemas narrativos dos episódios da Liga da Justiça, vi que, para uma sessão divertida e empolgante de RPG uma das coisas mais importantes é o controle do mestre em relação ao tempo da sessão e ao ritmo das cenas. A preparação da sessão de jogo seria feita de “baixo para cima”, ou seja, primeiro se tem em conta o tempo da sessão, os jogadores, etc, para depois, usando todo o seu material de campanha, cenário, livros de referência, livro de monstros, etc.; escrever a seqüência de cenas e desafios para os jogadores. Tendo em mente o tempo disponível e os jogadores que participarão da sessão de jogo, adapte sua idéia de aventura dentro destes limites.

Dessa maneira você foca mais sua preparação e pode “cortar gorduras”, ou seja, tirar da sua aventura tudo aquilo que é supérfluo e que não dá para encaixar no limite da sessão sem ficar chato e moroso. Pense nos filmes de ação ou de terror que você assistiu e gostou, a trama está sempre andando, não tem aquela de personagem ficar parado sem saber o que fazer. E olhe que os filmes tem em média de 2 horas de duração, e nem por isso eles deixam de passar emoções fortes.

Em termos de D&D, por exemplo, eu tenho uma regrinha para preparar sessões de 2 a 4 horas (que é normalmente o tempo que temos disponível). Eu sempre procuro dividir o tempo da sessão em 50% de interpretação e 50% de pancadaria, intercalando e equilibrando os dois momentos. Às vezes não tem jeito, tem momentos na aventura que predomina a interpretação enquanto em outros a pancadaria. Como estamos em uma campanha enorme, que irá até o nível 30, a cada sessão de jogo eu também passo mais um pedacinho do mistério da aventura, o que é outro segredo para manter os jogadores na maior fissura para jogar.

O interessante é ter em mente o tempo disponível para a sessão e dividi-lo com o que acontecerá. Um esquema básico para 2 a 3 horas de aventura, que uso em encontros de RPG é o seguinte:

1)      Uma cena introdutória onde os personagens interagem com PdMs, e onde surge o perigo/missão/conflito da aventura. Já comece com uma cena marcante, seja um ataque de monstros, seja uma população revoltada com o lorde da cidade e querendo linchá-lo por não ter feito nada para resolver o desaparecimento das crianças da região. Jogue o povo no meio do conflito que eles nem sentirão que já receberam a missão da aventura.

2)      Uma cena de investigação do conflito/mistério, com um pouco de interação com PdMs e com um combate mais fácil, com alguns elementos do problema principal a ser resolvido pela aventura. No final do combate os PJs aprendem algo sobre o mistério.

3)      A cena final, composta de uma parte de investigação e revelação, onde a história que está por trás do problema é revelada, e o conflito final com o inimigo principal da história, épico e com momentos dramáticos. Eu sempre guardo alguma revelação final para depois da derrota do vilão, o que deixa os jogadores com aquele ar de “caramba, e nós não tínhamos notado isso”!

4)      Se der tempo, descreva o que aconteceu depois, com os personagens sendo recebidos como heróis, ou, se eles morreram no combate final; descreva a tragédia que se sucedeu na região.

Focando na sessão, você poderá buscar em diversas fontes (Internet, livros, filmes, etc.) os elementos que serão vitais para a sessão, sem se preocupar com históricos e detalhes que não serão relevantes e que nem poderão ser mencionados pelo tempo hábil. Existe muito material que pode servir de inspiração, por exemplo, quando eu mestro D&D 3.5, eu sempre cato uma classe de prestígio interessante e que tem haver com a sessão para colocar em um PdM e surpreender os jogadores com algo original. Você também pode se inspirar em uma cena de filme para introduzir na sessão. Coisas dramáticas como fugas de prisão, batalhas à beira de um precipício, um combate em cima de um lago congelado que pode quebrar a qualquer momento, um duelo em nome da honra, etc. podem dar um toque especial para a sessão.

Os melhores mestres de RPG que eu conheci eram capazes de rolar uma aventura do nada, sem nenhuma preparação. O segredo deles estava na simplicidade e na capacidade de reconhecer o que realmente torna uma narrativa memorável. Esqueça os efeitos especiais, o mega-histórico de dez mil anos de história, as descrições ultra-mega detalhadas do pano de prato usado pelos drow elfos, o segredo de uma narrativa está no drama humano, que é o mesmo segredo dos grandes filmes e dos grandes livros. O cenário é apenas uma moldura, o que realmente “pega” o leitor/espectador/jogador de RPG é o drama humano que se desenrola, é onde ele se identifica.

Mas o que é esse tal de “drama humano”? É aquilo que a gente vive todos os dias, o medo de perder quem a gente gosta, é a vontade de conseguir alguma coisa, a luta por um sonho enquanto todo mundo diz que é loucura segui-lo, é sentir raiva quando se é injustiçado, é ter vontade de se vingar daquele playboy no Landrover que te cortou no meio da avenida Afonso Pena, é poder reencontrar seus grandes amigos, é ter saudade de casa, é fazer de tudo para manter uma amizade, é ter ciúmes, é querer provar algo para alguém que você admira ou odeia, etc. (AHAHAHAHA, o “drama humano” tá virando a música Gita, do Raul Seixas, “eu sou a luz das estrelas…”!).

Uma jeito legal de focar na sessão e preparar rapidamente um jogo de RPG é pensar em que tipo de dramas humanos você vai colocar nas suas 2 ou 3 horas disponíveis. A perda de um ente querido? Lembranças dolorosas do passado? Luta pela sobrevivência e as difíceis decisões éticas envolvidas, como quem vai morrer e quem vai viver? A redenção de um malfeitor? Você pode usar o drama humano para amarrar os históricos dos personagens nos eventos da sessão de jogo. Assim, se um personagem foi perdeu a família na infância, ele responderá imediatamente ao drama de um PdM que acabou de perder sua família por causas da tribo de kobolds satanistas que surgiu na região.

A última dica que dou para focar nas sessões de RPG primeiro e na aventura depois é aproveitar as oportunidades de cenas dramáticas ou engraçadas. O mestre deve ficar de olho aberto para as oportunidades de drama e ir “na onda”, mesmo que isso mude e altere a sua programação. Da interação com os PdMs surgem oportunidades sensacionais de interpretação e de cenas memoráveis, que, no meu ponto de vista, contam mais do que a própria aventura. Na minha versão adaptada para Forgotten da aventura A Fortaleza do Pendor das Sombras, que pode ser lida nesse link, teve várias cenas que surgiram do momento da sessão. Uma delas foi o duelo entre Jelly Burork, a orgulhosa guerreira comiriana do grupo com um dos principais guerreiros da milícia da cidade, um machão que jogou sua camisa suja no rosto da Jelly dizendo “lava para mim, mulher, é só para isso que vocês servem!”. O bate boca dos dois foi memorável e incluiu a pancadaria, onde o machão, antes de ser nocauteado pela Jelly, ficou dando tapinhas com sua espada nas coxas da cormiriana!

Foque na sessão e bom divertimento!

Quer mais drama humano que isso?
Quer mais drama humano que isso?

**********************************

ARTIGOS RELACIONADOS:

21 comentários

  1. Ôpa, valeu Nitro. =)

    Anotado… tiles de Cemitério e de Tavernas, vou começar por estes (o da taverna vai ficar bem legal!)

    Junto vou colocar um tutorial explicando como “montar”, colando em papel paraná com cola de contato (cola de sapateiro), assim ficam “duros” como os da Wizzards.

    Quanto às bases… tenho que pensar em algo que funcione… tampas de big coke, sei lá, tenho que testar… Esse cara de SP tem site? Como posso fazer contato com ele?

    PS: Você tem umas miniaturas de papel bacanas, podiamos colocar algumas de Cemitério e Taverna (taverneiro, garçonete gostosa-semi-nua, etc, hehehe) junto com os tiles. Tem umas coisas assim por aí não?

  2. @Groo
    Eu acho que seriam úteis tiles mais temáticos, como terrenos de gelo, lava, grama, pontes. Gostaria de tiles de tavernas, onde você poderia montar a taverna do jeito que você gostaria. No momento eu preciso de tiles de caixões e sarcófagos. Tiles de tumbas seria legal também.

    Da Wizards eu tenho os dois da 4ed, o Hall of Giant Kings, e o Streets of Shadow, 2 de cada. Sempre recomendo o pessoal comprar 2 de cada pois sempre faltam tiles! Esses oficiais vem com cerca de 20 páginas, dando um total de 40 a 50 tiles (entre tiles pequenos e grandes).

    As bases de portas e baús etc, são de Heroquest e outras encomendadas de um cara em São Paulo.

  3. Nitro, eu fiquei de fazer uns tiles pro Antonio (Mr. Pop) colocar lá no Pop Dice, deixa eu aproveitar e pegar umas dicas… =)
    . Quais tiles a Wizzards não tem e você sente falta ou acha que seriam úteis?
    . Quantos tiles vem mais ou menos num conjunto desses da Wizzards?
    . Aquelas bases de portas, laterais de baús, etc que vi nas fotos vem nestes conjuntos ou são outra coisa?
    Valeu!
    Groo

  4. QUE BOM!Se for isso mesmo vou encomendar,quando não sei,mas vou!

  5. Quem sabe uma hora você não lança um PDF “Dicas do Mestre” com a compilação de todas elas? [2]

    Ótima idéia.

  6. Dungeon Tiles por r$ 25?Inclui taxa de frete e conversão de dólar pra real,etc?

  7. É exatamente o que eu tô fazendo com a Trilogia do Fogo das Bruxas, que eu sempre quis mestrar mas não tinha a cara de nenhum dos cenários que eu mestro e ainda queria dar retoques pra ficar do meu jeito.

    Aliás, a campanha da 4E de FR é sensacional! Não sei se já disse isso, mas ao ler os diários dá vontade de estar na mesa junto com vocês!

    Se puder responde minha mensagem lá no Twitter sobre aqueles tiles de dungeons que eu perguntei como tu fez.

  8. É verdade Daniel, por isso ultimamente eu pego aventuras prontas e altero até ficar com a minha cara (mais from hell hehehehe).

  9. Muito bacana, mesmo! Depois que a gente começa a trabalhar, não dá pra preparar mais sessão como na época do colégio, o jeito é ir jogando eventos-chave e indo de peito aberto! =D

  10. Boa idéia Groo! Vou acumular mais artigos antes de fazer o PDF!

    Valeu pelos comentários pessoal!

  11. Esse artigo foi perfeito Newton, também sou da vanguarda do rpg no Brasil e tenho sempre que renovar minhas técnicas de narração. Mas não há nada que se compare em focar a campanha nos dramas humanos.

    Se puder faça uma visita ao meu Blog – http://pontoheroico.wordpress.com -, minha iniciativa foi inspirada em seu trabalho.

    PS.: Se puder faça alguma indicação ou coloque-me em seu Blogroll, seria uma honra.

    Abraços.

  12. hehehe, eu adoro este blog.

    Ótima “Dica do Mestre”… eu costumo copiar e salvar como arquivos de texto os artigos de que mais gosto, este já foi para lá.

    Quem sabe uma hora você não lança um PDF “Dicas do Mestre” com a compilação de todas elas?

Deixe um comentário!